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O que é o FirstMile, software que teria sido usado pela Abin para monitorar jornalistas e ministros do STF - Atualizado 25 janeiro 2024 - BBC BRASIL

 

mapa de localização

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Segundo investigação, a ferramenta pode ter sido utilizada de maneira ilegal por agentes da Abin durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para rastrear e monitorar dados de geolocalização de celulares.

Nesta quinta-feira (25/01), agentes da Polícia Federal realizam buscas em endereços ligados a doze suspeitos, entre eles o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), diretor Abin no governo anterior.

A suspeita é que uma organização criminosa teria funcionado dentro da agência para monitorar adversários políticos da família Bolsonaro e proteger filhos do então presidente de investigações da PF.Fim do Matérias recomendadas

A PF realizou buscas em Brasília, Juiz de Fora (MG), São João Del Rei (MG) e Rio de Janeiro. Um dos locais vasculhados foi o gabinete de Ramagem na Câmara dos Deputados.

A operação foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Por outro lado, ele não atendeu o pedido da PF para afastar Ramagem do seu mandato parlamentar.

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O software FirstMile, produzido pela empresa israelense Cognyte, está no centro da operação Última Milha, da PF. Em outubro, a operação havia prendido dois oficiais e afastou cinco dirigentes da Abin.

Segundo a PF, provas levantadas naquela ocasião levaram à realização da operação Vigilância Aproximada nesta quinta-feira.

De acordo com as investigações iniciais, os servidores usaram o FirstMile para monitorar membros do Supremo Tribunal Federal (STF), jornalistas, advogados e políticos durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.

O software foi adquirido sem licitação ainda no governo Michel Temer (MDB) durante a intervenção federal na área de segurança pública do Rio de Janeiro, mas teria sido utilizado mais intensamente no governo Bolsonaro, de acordo com a apuração da PF.

Esse monitoramento seria ilegal, diz a polícia, pois os agentes investigados precisariam de autorização judicial para realizá-lo.

Os investigados podem responder por vários crimes, como invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

Em nota publicada em seu site em outubro, a Abin afirmou que a corregedoria da agência instaurou uma sindicância investigativa sobre o assunto e que as informações apuradas estão sendo repassadas à Polícia Federal e ao STF.

A agência informou ainda que o software FirstMile deixou de ser utilizado em maio de 2021.

"A atual gestão e os servidores da Abin reafirmam o compromisso com a legalidade e o Estado Democrático de Direito", diz.

Na época, o Exército, que também adquiriu o software em 2018, afirmou à BBC News Brasil por meio de uma nota que não comentaria o caso.

Após a nova operação da PF, a BBC News Brasil procurou o deputado Ramagem por meio de seu gabinete, mas ainda não havia manifestação do parlamentar sobre a ação da PF.

A reportagem também tentou obter um posicionamento de Jair Bolsonaro por meio de Fabio Wajngarten, secretário de Comunicação do governo anterior, mas não obteve retorno.

Já senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente, se manifestou, por meio de sua assessoria, negando qualquer uso da Abin para protegê-lo.

A decisão de Moraes cita suposta atuação da Abin com a produção de relatórios de inteligência para ajudar sua defesa na investigação por um suposto esquema de rachadinha (desvio de salário de funcionários) em seu antigo gabinete de deputado estadual no Rio de Janeiro.

“É mentira que a Abin tenha me favorecido de alguma forma, em qualquer situação, durante meus 42 anos de vida. Isso é um completo absurdo e mais uma tentativa de criar falsas narrativas para atacar o sobrenome Bolsonaro”, disse o senador em nota.

“Minha vida foi virada do avesso por quase cinco anos e nada foi encontrado, sendo a investigação arquivada pelos tribunais superiores com teses tão somente jurídicas, conforme amplamente divulgado pela grande mídia”, disse ainda.

Como a ferramenta funciona?

O software FirstMile teria capacidade de monitorar a geolocalização de até 10 mil celulares por um período de um ano. Pelo que se sabe, a ferramenta não tem acesso a mensagens ou a ligações dos alvos rastreados.

Segundo Rafael Zanatta, diretor da ONG Data Privacy Brasil, o software "invade" e "engana" a rede de empresas de telefonia para conseguir rastrear o alvo do monitoramento.

"Todo celular emite informações para o que chamamos de uma 'estação rádio-base', que seriam as antenas de celular espalhadas pelo país, em um protocolo conhecido como SS7", explica Zanatta.

computador

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,

FirstMile teria capacidade de monitorar celulares por até 12 meses

"O que se descobriu é que esse software consegue bagunçar esse protocolo, enganando a estação e perguntando a ela: 'qual era a localização do número tal nesse momento exato?'", diz.

Por lei, essas informações são sigilosas, ou seja, uma operadora de celular só pode fornecer a geolocalização de seus clientes mediante autorização da Justiça. É diferente, por exemplo, de quando o próprio usuário permite que aplicativos, como o Google ou o Uber, tenham acesso a esses dados.

"O que o software FirstMile faz é atacar o sistema das operadoras, ou seja, isso deveria ser uma preocupação delas também. Esses dados são depois armazenados em nuvem e o histórico é analisado e vendido ao cliente", diz Zanatta.

"Essas informações podem ser usadas de diversas formas, como em investigações policiais contra o crime organizado, mas também podem ser um atrativo para monitorar ilegalmente opositores políticos e a própria população, atacando o direito a liberdades cívicas, como o de manifestação", afirma.

De acordo com um relatório da Anistia Internacional de 2021, serviços oferecidos pela Cognyte, a empresa israelense que desenvolveu o FirstMile, "foram utilizados pelo governo do Sudão para instrumentalizar perseguição e violação de direitos de opositores.”

Em março, após o caso Abin ser revelado pelo jornal O Globo, a ONG Data Privacy Brasil enviou um ofício ao Ministério Público Federal pedindo que o uso do FirstMile fosse investigado pelo órgão.

Segundo a ONG, "a utilização do FirstMile pela Abin apresenta um grave problema de violação do direito fundamental autônomo à proteção de dados pessoais".

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