Pular para o conteúdo principal

O MASSACRE DE SUZANO - POR SPUTNIK BRASIL - 21/03/2019

Mulher coloca vela em frente a Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano, Grande São Paulo, palco do atentado que deixou 10 pessoas mortas

© REUTERS / Amanda Perobelli

O massacre ocorrido em uma escola em Suzano na semana passada deixou muitas perguntas e angústias que precisam ser resolvidas pela sociedade brasileira. A Sputnik Explica o que pode ser feito para que episódios como esses não virem recorrentes no país.
Era quarta-feira, dia 13 de março de 2019, 9h30 (horário de Brasília), e os 600 alunos da Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano, na Grande São Paulo, desceram para o intervalo quando ouviram barulhos que pensavam inicialmente ser "bombinhas de festa junina". Se enganaram.
Os barulhos eram tiros disparados de um revólver com numeração raspada da marca brasileira Taurus, calibre 38. Os autores dos disparos, os ex-alunos da escola Guilherme Tauci Monteiro, de 17 anos, e Luiz Henrique de Castro, de 25 anos, disparavam a esmo contra seus alvos como se estivessem em um jogo de videogame.
Polícia Militar no Rio de Janeiro durante operação no bairro de Santa Teresa, 8 de fevereiro de 2019

A cena de terror deixou dez pessoas mortas, incluindo dois funcionários, os dois assassinos e seis alunos do colégio. Outros 11 foram feridos pelos ataques. Mas o que fica de lição após esse ataque? O que esse tipo de ação fala sobre a sociedade brasileira? Onde estamos errando?
A Sputnik Brasil entrevistou especialistas de diversas áreas para saber o que fazer no pós-Suzano para que massacres desse tipo sejam evitados.
Armas nas mãos de professores e funcionários evitariam as mortes?
O luto e a dor das famílias que perderam os seus filhos não impediram que políticos de diversos espectros ideológicos usassem o acontecimento politicamente para fazer campanha pela flexibilização ou não do porte de armas no Brasil.
O senador Major Olímpio (PSL-SP) afirmou que o massacre teria sido evitado caso os funcionários da escola estivessem armados.
"Se tivesse um cidadão com arma regular dentro da escola, professor, servente, um policial militar aposentado, ele poderia ter minimizado o tamanho da tragédia. Vamos, sem hipocrisia, chorar os mortos e discutir a legislação, e onde estamos sendo omissos ", disse.
Policiais em torno da Escola Estadual Raul Brasil em Suzano
© REUTERS / AMANDA PEROBELLI
Polícia: assassinos Horas depois Olímpio foi rebatido pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que afirmou que a ideia aventada por alguns defensores da ideia do porte de armas, levaria a uma "barbárie".
"O que eu espero é que alguns não defendam que, se os professores estivessem armados, teriam resolvido o problema. Pelo amor de Deus. Espero que as pessoas pensem um pouquinho primeiro nas vítimas dessa tragédia e depois compreendam que o monopólio da segurança pública é do Estado. Não é responsabilidade do cidadão", disse Maia aos repórteres sem citar o Major Olímpio.
Um levantamento feito pelo Instituto Sou da Paz, a partir do ataque em Suzano, mostrou que desde 2002, ao menos oito escolas brasileiras sofreram com episódios em que alunos ou ex-alunos armados abriram fogo contra estudantes e funcionários. Os atentados deixaram um total de 28 mortos e 41 feridos no período.
"Se fizermos uma média, os massacres acontecem a cada dois ou três anos", comentou Ivan Marques, diretor-executivo do Instituto à Sputnik Brasil.
Em metade desses casos, os jovens atiradores utilizaram armas que estavam armazenadas em suas casas, segundo o levantamento. Dos oito casos registrados desde 2002, seis utilizaram a pistola calibre 38 da Taurus.
"Agora imagina se nós, de fato, flexibilizarmos como muitos querem, outros tipos de armamento. Ou mesmo a flexibilização do acesso ao revólver Taurus 38. O estrago que isso teria sido causado, os danos e de vítimas poderiam ser muito maiores", explicou Ivan Marques.
No entanto, o diretor-executivo do Instituto Sou da Paz, pondera dizendo que não é apenas do acesso às armas a culpa da tragédia ocorrida na Escola Estadual Raul Brasil e que "muito fatores que levam a situações como a de Suzano".
"Acho que não há uma correlação direta entre mais armas em circulação e mais massacres em escolas. Mas, sem dúvida nenhuma, há uma correlação entre mais armas em circulação e mais armas disponíveis para resolução de conflitos de forma violenta e armada", completou.
O que são os ‘chans' e como eles ajudaram na tragédia de Suzano?
Os dois autores do atentado em Suzano estão sendo investigados por uma possível ligação com um grupo virtual no qual mensagens de ódio são espalhadas e crimes violentos são prometidos constantemente.
Os chamados "chans", fóruns virtuais muitas vezes situados na dark web entraram na mira da Polícia Federal e do Ministério Público após os assassinatos.
Segundo Arthur Igreja, professor da FGV e especialista em tecnologia e inovação, esses fóruns virtuais, não são sempre espaços de propagação de ódio, mas em muitos casos são criados com esse fim.
"A dark web é totalmente voltada ao anonimato, foi criada originalmente para ser um canal de delação, um canal confiável para pessoas que são perseguidas, jornalistas, então háquem usa esse tipo de artifício usa para o bem", disse em entrevista à Sputnik Brasil.
Uma mulher com arma
Para o psicanalista Sérgio Luís Braghini, coordenador do curso de pós-graduação em Psicossociologia da Juventude da Fundação Escola Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), o problema é que esses jovens acabam absorvendo os discursos de ódio propagado nesses fóruns.
"O adolescente acaba reproduzindo, nas entrelinhas, algo que ocorre no discurso social. Quando a propagação desses discursos se torna algo além de um ato isolado, quando começa a ocorrer em certo número, não é mais um fenômeno individual, tem alguma coisa que está ocorrendo no social que de alguma maneira transmite isso", comentou em entrevista à Sputnik Brasil.
Entre 2017 e o ano passado, houve aumento de 29% no número de ações na Justiça acompanhadas pelo Ministério Público Federal (MPF) relacionadas a crimes de ódio na internet — os registros passaram de 342 em 2017 para 442 no ano passado.
E agora, o que fazer no pós-Suzano?
Além das investigações policiais sobre as motivações que levaram esses jovens a atacar a Escola Estadual Raul Brasil, é necessário que se pense em como prevenir para que casos semelhantes não se tornem frequentes.
Armas apreendidas pelo Poder Judiciário e pelas polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro destruídas pelo Exército Brasileiro e o Conselho Nacional de Justiça (arquivo)
© FOTO : TÂNIA RÊGO/AGÊNCIA BRASIL
Tiros e gritaria: Brasil está pronto para flexibilizar acesso a armas de fogo?A sociedade brasileira capaz de enxergar os seus membros, seus cidadãos para que elas não recorram a esse tipo de sociabilidade via dark web para que problemas psicológicos, frustrações, sentimento de não pertencimento e busca por vingança acabe permeando as motivações de muitos desses jovens que cometem esse tipo de atrocidade", concluiu.
Já Sérgio Luís Braghini defende que seja construída algum tipo de memória desse caso na Escola Estadual Raul Brasil, para que seja lembrado e nunca mais repetido.
"A memória é fundamental para que a gente possa esquecer. A gente só pode lembrar de algo que esqueceu. Se eu apago, não tenho sequer a possibilidade de esquecer. (…) Não é a memória que nos é traumática, é o não poder esquecer que nos é traumático", concluiu.
Resta saber como a sociedade brasileira vai reagir ao pós-Suzano para que as lembranças das imagens traumáticas desse 13 de março de 2019 não virem feridas abertas que se espalhem por outros lugares do país.    

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Carta das Centrais Sindicais ao Presidente Bolsonaro

“EXMO. SR. JAIR MESSIAS BOLSONARO MD. PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL BRASÍLIA – DF Senhor Presidente, As Centrais Sindicais que firmam a presente vem, respeitosamente, apresentar-se à Vossa Excelência com a disposição de construir um diálogo em benefício dos trabalhadores e do povo brasileiro. Neste diálogo representamos os trabalhadores, penalizados pelo desemprego que atinge cerca de 12,4 milhões de pessoas, 11,7% da população economicamente ativa (IBGE/PNAD, novembro de 2018) e pelo aumento da informalidade e consequente precarização do trabalho. Temos assistido ao desmonte de direitos historicamente conquistados, sendo as maiores expressões desse desmonte a reforma trabalhista de 2017, os intentos de reduzir direitos à aposentadoria decente e outros benefícios previdenciários, o congelamento da política de valorização do salário mínimo e os ataques à organização sindical, as maiores expressões deste desmonte. Preocupa-nos sobremaneira o destino da pol

19 Exemplos de publicidade social que nos fazem pensar em problemas urgentes - POR: INCRÍVEL.CLUB

Criadores de propagandas de cunho social têm um grande desafio: as pessoas precisam não apenas notar a mensagem, mas também lembrar dela. Você deve admitir que, mesmo passados vários anos, não consegue tirar da cabeça algumas peças publicitárias desse tipo, que fizeram com que passasse a enxergar determinadas situações sob uma outra ótica. Se antes as propagandas sociais abordavam tmas como a poluição do meio ambiente com plástico e o aquecimento global, hoje existem campanhas sobre os perigos do sedentarismo, os riscos que o tabagismo representa aos animais em decorrência do aumento de incêndios florestais e até sobre a importância das férias para a saúde humana. São, portanto, peças que abordam problemas atuais e familiares para muita gente. Neste post, o  Incrível.club  mostra a você o que de melhor foi criado recentemente no campo das propagandas de cunho social. Fumar não é prejudicial apenas à sua saúde, mas também aos animais que vivem em áreas que sofrem com incênd

Empresas impõem regras para jornalistas

REDE SOCIAIS Por Natalia Mazotte em 24/5/2011 Reproduzido do Jornalismo nas Américas http://knightcenter.utexas.edu/pt-br/ , 19/5/2011, título original: "Site de notícias brasileiro adota regras para o uso das redes sociais por jornalistas"; intertítulo do OI Seguindo a tendência de veículos internacionais , o site de notícias UOL divulgou aos seus jornalistas normas para o uso de redes sociais , de acordo com o blog Liberdade Digital. As recomendações se assemelham às já adotadas por empresas de notícias como Bloomberg , Washington Post e Reuters : os jornalistas devem evitar manifestações partidárias e políticas, antecipar reportagens ainda não publicadas ou divulgar bastidores da redação e emitir juízos que comprometam a independência ou prejudiquem a imagem do site. Segundo um repórter do UOL, os jornalistas estão tuitando menos desde que as diretrizes foram divulgadas . "As pessoas estão tuitando bem menos. Alguns cogitam deletar seus p