Pular para o conteúdo principal

OBSERVATÓRIO - Liberdade Religiosa à Luz da Constituição Federal - Publicado por Renato Moya - FONTE: JUSBRASIL


De todo exposto conclui-se, inicialmente, que, levando em consideração a evolução histórica do Brasil e refletindo sobre seu início, é possível notar a dificuldade que o direito, chamado liberdade religiosa, enfrentou para consolidar-se no ordenamento jurídico nacional como uma garantia fundamental. 

Na história do Brasil, durante seu período de colonização o império sempre tentou restringir a liberdade religiosa, professando como verdadeira, apenas uma única religião, até então, o Estado se confundia com a Igreja, sendo que, apesar de outras religiões coexistirem, com destaque as crenças de origem indígena e africana, apenas a Igreja Católica Apostólica Romana era a igreja oficial, largamente aceita e disseminada. Com a proclamação da república em 15 de novembro de 1889 o Estado tornou-se laico no Brasil, garantindo o direito à liberdade religiosa, no entanto o catolicismo ainda era a religião oficial do Estado. Após todas as revoluções históricas e sociais, garantir este direito se torna uma obrigação legislativa, por este motivo, além da garantia constitucional, outras leis se fizeram necessárias para que tal direito pudesse ser gozado de maneira ampla e irrestrita na forma da lei, evitando qualquer tipo de intolerância, imposição e discriminação religiosa.
Atualmente, o Brasil é um país livre de qualquer ditadura religiosa, sendo livre o exercício de qualquer religião, bem como a opção de não aderir a nenhuma religião em específico, no entanto, como todo e qualquer ditame social, se faz necessária uma normatização abrangente para garantia e controle destes direitos, pois o homem necessita de normas para regulamentar o seu exercício social, especificando os limites e alcances, evitando desta forma, abusos e restrições aos direitos constitucionais. Nos últimos anos, a jurisprudência nos Tribunais e as edições normativas do Poder Legislativo, vêm demonstrando um avanço singelo, mas significativo nesta área dos direitos universais do homem, consagrado principalmente no nosso texto constitUcional a liberdade religiosa, garantindo o amplo exercício deste direito, nas formas e nos parâmetros da lei, tendo decisões firmes e corretas diante dos diversos conflitos apresentados no tocante a este tema. Sem sombra de dúvidas o símbolo mor da garantia da liberdade religiosa no Brasil, foi a promulgação daConstituição Federal da República do Brasil de 1988, com destaque em seu preâmbulo, seguido do artigo , inciso VI e VIII, após este marco, vários outros textos legislativos ordinários foram editados e promulgados, bem como outros diversos projetos de leis estão em tramitação no Senado Federal.
A importância deste assunto não é estritamente da sociedade moderna, pois com um curto olhar ao longo da história humana, se nota a constante busca a uma crença religiosa, seja qual for. Na mesma senda, vários foram os abusos ao se ditar uma religião única na sociedade, muitas guerras possuíram cunho religioso e outras muitas foram lutadas para garantir a confissão de uma determinada opção religiosa. Posto isto, o Estado democrático de Direito, visa garantir a coexistências das diversidades sociais, não apenas no âmbito religioso, mas em todos os demais direitos individuais e coletivos, sendo que no Brasil, tais garantias são irrevogáveis, demonstrando desta forma, que a maior e melhor maneira de se conviver em sociedade e evitar conflitos, é respeitando e garantindo a existências das diferenças de consciência social.
1. LIBERDADE RELIGIOSA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988
1.1. Liberdade de Consciência
Mesmo na vigência de um Estado democrático de direito, se faz necessária a garantia da liberdade de consciência, pois esta é a maneira pela qual fica assegurado ao indivíduo a não imposição pelo Estado de valores morais de maneira compulsória, garantindo que cada cidadão possa pensar e acreditar em tudo aquilo que considerar correto, sem nenhuma interferência estatal. O Estado possui por obrigação o dever de propiciar um ambiente social adequado no qual cada cidadão possa desenvolver livremente sua própria forma de pensamento, garantido que as minorias não sejam abalroadas pelas maiorias, impedindo e repreendendo o preconceito e a intolerância de modo que nenhuma forma de raciocínio possa ser imposta sem o real consentimento do receptor.
A liberdade de pensamento está intimamente ligada à liberdade de consciência, pois esta primeira é a externalização da segunda. A liberdade de consciência esta conexa ao íntimo
do homem, no qual cada indivíduo possui sua própria maneira de se conscientizar sobre o
mundo ao redor, de outro lado, a liberdade de pensamento é a ação pela qual o ser exprime publicamente sua forma de consciência, passando a externar a suas convicções mais intimas.
De outro modo não poderia ocorre, se não com a inércia do Estado sobre a consciência
dos indivíduos, pois está liberdade é a mãe de todas as demais, sendo esta cerceada, todas as demais não conteriam nenhum sentido.
Nesta senda, conclui-se com o texto de Fernando G. Jayme, enfatizando a importância de tais direitos:
“Estes direitos são uma via, um método a ser desenvolvido por toda a humanidade em direção à realização da dignidade humana, fim de todos os governos e povos. Assegurado o respeito à pessoa humana, assegura-se, por conseguinte, sua existência digna, capaz de propiciar- 26 lhe o desenvolvimento de sua personalidade e de seus potenciais, para que possa alcançar o sentido de sua própria existência. Isso significa conferir liberdade no desenvolvimento da própria personalidade”. (JAYME, 2005, p.9)
1.2. Liberdade de Crença
Garantida constitucionalmente e protegida pelo artigo , inciso VII, da Constituição, a liberdade de crença se resume no livre o direito a escolha e exercício de qualquer crença, sem qualquer imposição estatal, se origina no Estado democrático de direito, bem como na laicidade do Estado.
Como bem leciona José Afonso da Silva:
“Na liberdade de crença entra a liberdade de escolha da religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa, a liberdade (ou o direito) de mudar de religião, mas também compreende a liberdade de não aderir à religião alguma, assim com a liberdade de descrença, a liberdade de ser ateu e de exprimir o livre agnosticismo. Mas não compreende a liberdade de embaraçar o livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença, pois também a liberdade de alguém vai até onde não prejudique a liberdade dos outros”. (SILVA, 2007, p.248) (SIC).
Tem-se ainda, que a liberdade de crença é um direito intimamente ligado à dignidade da pessoa humana[1], sendo que não há em que se falar em democracia ou dignidade, sem que haja o direito a liberdade de crença, conforme as lições de Aldair Guedes Soriano:
“A constituição de 1988, no art. , inciso III, consagrou o princípio da dignidade da pessoa humana. Esse princípio, aliás, tem um alcance universal. Entretanto não há que se falar em dignidade da pessoa humana diante da restrição da liberdade religiosa ou da inexistência de liberdade no sentido mais lato. Por outro lado, a tolerância religiosa, entendida como um profundo respeito à convicção religiosa de outrem, é um fator que promove a paz e fraternidade entre os povos”. (SORIANO, 2002, p.17).
Desta forma, a crença e o direito de livremente exercê-la é componente fundamental não apenas da liberdade religiosa, mas do princípio da dignidade da pessoa humana.
1.3. Cultos Religiosos
Os cultos religiosos são as formas mais nítidas de exteriorização das crenças, estas manifestações se dão por meio de cerimônias, reuniões, ritos, cultos, dentre outros.
Acerca deste tema, explica José Afonso da Silva:
“A religião não é apenas sentimento sagrado puro. Não se realiza na simples contemplação do ente sagrado, não é simples adoração a Deus. Ao contrário, ao lado de um corpo de doutrina, sua característica básica se exterioriza na prática de ritos, no culto, com suas cerimônias, manifestações, reuniões, fidelidades aos hábitos, às tradições, na forma indicada pela religião escolhida”. (SILVA, 2007, p.249).
Ausente à forma prática da religião, não é possível afirmar a existência da liberdade religiosa, pois a primeira é consequência da garantia da segunda.
Neste sentido temos o posicionamento de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra da Silva Martins:
“A liberdade religiosa consiste na livre escolha pelo indivíduo da sua religião. No entanto, ela não se esgota nessa fé ou crença. Demanda uma prática religiosa ou culto como um dos seus elementos fundamentais, do que resulta também inclusa, na liberdade religiosa, a possibilidade de organização desses mesmos cultos, o que dá lugar às igrejas”. (BASTOS; MARTINS, 2004, pg. 52).
1.3.1. Livre Exercício
A liberdade do livre exercício dos cultos religiosos está prevista na Constituição Federal de 1988, no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, em seu artigo, inciso VI. Está relacionada com a obrigação estatal de não intervenção aos locais de culto, bem como o dever de propiciar meios pelos quais possam estas manifestações serem executadas sem o constrangimento por terceiros.
Uma das medidas mais notáveis que o Estado toma para que não haja a constrição dos cultos e seu consequente livre exercício é a imunidade tributária[2] contida no Artigo 150, inciso VI, alínea b da Constituição, propiciando assim, a não intervenção do Estado nas relações de culto.
Outra importante garantia constitucional, em relação ao livre exercício dos cultos religiosos é a disposição contida no artigo 19, inciso I da Constituição:
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;
Desta forma, é notável o interesse estatal em garantir o livre exercício dos cultos religiosos por meio de disposições constitucionais para garantia deste direito religioso.
Neste sentido é o ensinamento de José Afonso da Silva:
“É evidente que não é a lei que vai definir os locais de culto e suas liturgias. Isso é parte da liberdade de exercício dos cultos, que não está sujeita a condicionamento. É claro que não há locais, praças, por exemplo, que não são propriamente locais de culto. Neles realizam cultos, mais no exercício da liberdade de reunião do que no da liberdade religiosa. A lei poderá definir melhor esses locais não típicos de culto, mas necessários ao exercício da liberdade religiosa. E deverá estabelecer normas de proteção destes e dos locais em que o culto normalmente se verifica, que são só templos, edificações com as características próprias da respectiva religião”. (SILVA, 2007, p. 250)
1.3.2. Proteção aos Locais de Culto
A origem da palavra culto advém da palavra em latim cultu, possui a definição literária de acordo com Sergio Ximenez como: “Culto sm. 1. Adoração à divindade. 2. Ritual que exterioriza essa adoração. 3. Adoração, veneração. 4. Reverência, homenagem”. (XIMENEZ, 2000, p.273) (SIC).
Nota-se a partir desta primeira consideração que a constituição em seu artigo , inciso VI, utiliza a elocução “culto” de maneira intencional, posta propositalmente pelo legislador, pois culto é gênero de todas as suas formas, como por exemplo, templo, igreja, salão de reunião, dentre outros. Desta forma a Carta Magna, garante uma proteção mais abrangente para a prática do exercício religioso, resumida no culto, mas, todavia, atingindo todas as suas esferas.
Portanto, trata-se de uma obrigação tanto social, quanto estatal, garantir que os locais de culto sejam protegidos nos termos da lei. Sendo garantida, assim como na proteção do domicílio individual, a segurança a estes locais de destinações religiosas, que em sua essência nuclear são invioláveis, assim como a residência dos indivíduos.
É o âmbito mais íntimo das práticas religiosas, é moralmente inviolável, surge a partir desta concepção a obrigatoriedade constitucional e zelar por estes locais, garantindo-lhes a segurança e a liberdade para as práticas canônicas, sendo que nem mesmo o poder de polícia pode ser deliberadamente praticado, guardando assim pela imparcialidade do Estado em relação às práticas religiosas que não infrinjam nenhuma norma legal.
CONCLUSÂO
De todo exposto conclui-se, inicialmente, que, levando em consideração a evolução histórica do Brasil e refletindo sobre seu início, é possível notar a dificuldade que o direito, chamado liberdade religiosa, enfrentou para consolidar-se no ordenamento jurídico nacional como uma garantia fundamental. 
Consequentemente, até que esta garantia tomasse posse nas constituiçõeConstituição Federal de 1988, adjetiva de Constituição Cidadã, possui lugar de destaque entre os direitos e garantias fundamentais do artigo  deste diploma legal.
s e leis ordinárias, houve um considerável avanço legislativo e social, criando um ambiente perfeito para o surgimento e aperfeiçoamento desta garantia, que atualmente, na 
A despeito da magnitude deste direito, o direito à liberdade religiosa, bem como sua
extrema importância para a sociedade, não restam equívocos no tocante a sua cristalização, tanto na Jurisprudência, quanto na Doutrina ou nas leis e projetos de leis, confirmando novamente a sua relevância social.
Cumpre também ressaltar, que não há pleno exercício desta garantia, sem que haja a colaboração dos cidadãos, e de forma mais relevante, do Estado, como entidade zeladora da liberdade religiosa, devendo esta instituição, da qual emanam todos os regramentos sociais, por meio de leis e da prestação jurisdicional, propiciar um ambiente laico, sem o uso do poder estatal para o favorecimento desta ou daquela entidade religiosa.
O Estado laico, portanto, é um marco para a proliferação do direito à liberdade religiosa, sendo que esta laicidade contribui efetivamente para que não haja intolerância às diversas religiões que fazem parte da sociedade. Desta maneira, restou claro que a liberdade religiosa é um direito fundamental ao homem, que se sobrepõe muitas vezes ao direito individual, pois aquele interessa a uma coletividade, sendo que este faz frente apenas ao indivíduo. Paradoxalmente, cada indivíduo deve ser respeitado em sua intimidade e consciência, sendo que todos possuem o direito a ter ou não uma determinada crença ou religião. São estes de qualquer forma, inquestionavelmente valores constitucionais incontestáveis, que de propósito foram postos ali pelo legislador, visando o convívio social pleno, privando a sociedade que qualquer forma de intolerância religiosa.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Carta das Centrais Sindicais ao Presidente Bolsonaro

“EXMO. SR. JAIR MESSIAS BOLSONARO MD. PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL BRASÍLIA – DF Senhor Presidente, As Centrais Sindicais que firmam a presente vem, respeitosamente, apresentar-se à Vossa Excelência com a disposição de construir um diálogo em benefício dos trabalhadores e do povo brasileiro. Neste diálogo representamos os trabalhadores, penalizados pelo desemprego que atinge cerca de 12,4 milhões de pessoas, 11,7% da população economicamente ativa (IBGE/PNAD, novembro de 2018) e pelo aumento da informalidade e consequente precarização do trabalho. Temos assistido ao desmonte de direitos historicamente conquistados, sendo as maiores expressões desse desmonte a reforma trabalhista de 2017, os intentos de reduzir direitos à aposentadoria decente e outros benefícios previdenciários, o congelamento da política de valorização do salário mínimo e os ataques à organização sindical, as maiores expressões deste desmonte. Preocupa-nos sobremaneira o destino da pol

19 Exemplos de publicidade social que nos fazem pensar em problemas urgentes - POR: INCRÍVEL.CLUB

Criadores de propagandas de cunho social têm um grande desafio: as pessoas precisam não apenas notar a mensagem, mas também lembrar dela. Você deve admitir que, mesmo passados vários anos, não consegue tirar da cabeça algumas peças publicitárias desse tipo, que fizeram com que passasse a enxergar determinadas situações sob uma outra ótica. Se antes as propagandas sociais abordavam tmas como a poluição do meio ambiente com plástico e o aquecimento global, hoje existem campanhas sobre os perigos do sedentarismo, os riscos que o tabagismo representa aos animais em decorrência do aumento de incêndios florestais e até sobre a importância das férias para a saúde humana. São, portanto, peças que abordam problemas atuais e familiares para muita gente. Neste post, o  Incrível.club  mostra a você o que de melhor foi criado recentemente no campo das propagandas de cunho social. Fumar não é prejudicial apenas à sua saúde, mas também aos animais que vivem em áreas que sofrem com incênd

Empresas impõem regras para jornalistas

REDE SOCIAIS Por Natalia Mazotte em 24/5/2011 Reproduzido do Jornalismo nas Américas http://knightcenter.utexas.edu/pt-br/ , 19/5/2011, título original: "Site de notícias brasileiro adota regras para o uso das redes sociais por jornalistas"; intertítulo do OI Seguindo a tendência de veículos internacionais , o site de notícias UOL divulgou aos seus jornalistas normas para o uso de redes sociais , de acordo com o blog Liberdade Digital. As recomendações se assemelham às já adotadas por empresas de notícias como Bloomberg , Washington Post e Reuters : os jornalistas devem evitar manifestações partidárias e políticas, antecipar reportagens ainda não publicadas ou divulgar bastidores da redação e emitir juízos que comprometam a independência ou prejudiquem a imagem do site. Segundo um repórter do UOL, os jornalistas estão tuitando menos desde que as diretrizes foram divulgadas . "As pessoas estão tuitando bem menos. Alguns cogitam deletar seus p