OBSERVATÓRIO - Treze de maio: Paiva promove debate sobre negro no mercado de trabalho - Câmara dos Vereadores de Piracicaba
Em palestra do historiador, professor e pesquisador, Ramatis Jacino o parlamentar promoveu mesa redonda para avaliar o negro no mercado de trabalho.
O vereador José Antônio Fernandes Paiva (PT), mediante o apoio da Câmara de Piracicaba, por ocasião da passagem do dia 13 de maio, que marca os 127 anos do fim da escravidão no Brasil promoveu debate sobre a inserção do negro no mercado de trabalho, com foco à palestra do historiador, professor e pesquisador Ramatis Jacino, que ocupou as dependências do salão nobre "Prof. Helly de Campos Melges", na noite desta quarta-feira (13), às 20h00, com público em torno de 100 pessoas, entre alunos das escolas "Prof. João Chiarini" e Escola Técnica do Brasil, para discutir a temática perante membros do Conselho da Comunidade Negra de Piracicaba (Conepir), Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial (Inspir), Coletivo de Combate ao Racismo (CUT- Campinas) e movimentos negros da região.
O evento teve transmissão ao vivo pela TV Câmara, canal 08 da Net, TV Digital canal 60.1 UHF e pela rede mundial de computadores, a internet, no endereço eletrônico www.camarapiracicaba.sp.gov.br
O secretário municipal de Trabalho e Renda de Piracicaba, Sérgio Furtuoso abriu o ciclo de saudações da noite e, destacou a condição de participar do evento para ouvir e observar os avanços que a cidade confere nas políticas de ações afirmativas, com foco à igualdade. Também ressaltou o caráter da secretaria que coordena, que perpassa todas as ações, na busca da sensibilização, do reconhecimento, para dar condições iguais. Disse ainda que hoje vê pessoas resistentes. "Sim, existe toda uma necessidade de avaliar a questão, para lutarmos por uma sociedade de fato e de direito", disse.
Marcelo Borrascas falou em nome da OAB Piracicaba e, destacou a importância do tema, que tem de ser discutido amplamente. Marcelo Abrahão, do Coletivo de Combate ao Racismo, CUT-Campinas, enfatizou a discussão da temática, reforçando o quanto é excludente a condição de ser negro no Brasil.
O representante do Conselho das Entidades Sindicais de Piracicaba (Conespi), presidente da Associação dos Aposentados e Pensionistas de Piracicaba (Ecletica), João Carlos (João Carteiro) reiterou ajuda a todos, o que demanda o despertar de consciência de cada um para prosseguir na luta.
O representante do Conselho da Comunidade Negra de Piracicaba (Conepir), Acácio Godoy pediu licença para falar da alegria de constatar a presença de diversos jovens que compareceram ao evento. Citou que menos de dois por cento dos funcionários de bancos são negros, o que reflete o racismo.
O presidente do Conepir, Adney Araújo saudou a presença dos mais vividos, no que incluiu sua mãe, além de denominar a formação da mesa diretiva dos trabalhos e, destacar a condição do Sindicato dos Bancários, em mapeamento para verificar a situação do negro no mercado de trabalho, o que reverte em ações positivas da entidade. Também traçou um histórico, desde a libertação dos escravos, para dizer das justificativas que embasaram a lei áurea. E, disse que depois de 122 anos veio o Estatuto da Igualdade Racial, para garantir direitos de cidadania ao povo negro.
Adney também falou de uma luta, muitas vezes escrita por sangue. Além de citar pessoas que se destacaram no movimento negro local, como a militante Maria Araújo, no que pontuou a importância de um povo conhecer sua historia e, sair das questões de lamúria. "Lei de Cota não se discute, é lei e tem que ser cumprida", disse.
O presidente do Inspir, Francisco Carlos Quintino falou da satisfação de estar mais um vez em Piracicaba. E, relembrou que foi aqui que nasceu a proposta da Carta de Piracicaba, que ganhou o apoio dos demais sindicatos, em março de 2013, com 50 mil trabalhadores, culminando em marcha a Brasília, na entrega do documento à presidente Dilma, que sancionou as cotas raciais na esfera federal.
Quintino citou a passagem do dia 13 de maio, lembrando que se tivesse havido a preocupação da reparação, hoje não estaríamos discutindo a questão de cotas. Também abordou as questões diuturnas sobre o racismo. Concluiu suas considerações evocando pronunciamento do ex-técnico da seleção brasileira de futebol, Zagalo, ao dizer que "terão que me engolir", para reforçar a continuidade de lutas e, por mostrar de que o povo negro não quer ser melhor do que ninguém e, sim ter igualdade de direitos.
O vereador José Antônio Fernandes Paiva iniciou suas considerações agradecendo a presença de todos. E, discorreu sobre as articulações para a vinda do professor Jacino na palestra. Também falou da preocupação de promover o evento para desmistificar a questão negra, dado à sua invisibilidade no mercado de trabalho, na escola, nas igrejas. Também agradeceu a presença de alunos. E, reforçou a continuidade de luta, o que também inclui o movimento sindical, na transformação da sociedade.
Na sequencia do evento, o vereador Paiva e o secretário municipal de Trabalho e Renda, Sérgio Furtuoso receberam exemplares do livro de autoria do palestrante da noite, Ramatis Jacino, intitulado "O negro no mercado de trabalho em São Paulo, após a abolição, 1912 - 1920.
No transcorrer de sua palestra, o professor Ramatis Jacino registrou o acontecimento em Piracicaba como exemplo de vitória de luta contra a discriminação racial, de pessoas de correntes políticas e de diferentes ideologias que prestigiaram o evento. E destacou a condição de instrumentalizar as pessoas para um novo olhar sobre a história do negro, daqueles de contribuíram para a riqueza do Brasil, que se baseou em dois crimes bárbaros, o massacre dos indígenas e a escravidão do negro.
Ramatis disse que a escravidão foi um modo de produção que por mais de 350 anos o Brasil se apoderou deste sistema. Lembrou que num determinado tempo a escravidão se exauriu, não tinha mais razão de permanecer, sendo que neste instante, quem detinha o poder passou a pensar em como permanecer na condição de explorador.
Jacinto citou as diferentes fazes do sistema, que passou pelo surgimento do mercantilismo e do capitalismo, onde prevaleceu um sistema para contradizer que não foi a lógica de uma princesa boazinha que contribuiu para o fim da escravidão.
Pontuou que os grandes governantes e proprietários iniciaram o processo com o temor de que os escravos viessem a ser os operários. Também comentou sobre a criação de leis, a exemplo de isentar os escravizados, que acabavam pagando com o trabalho a passagem de volta à África.
Ramatis citou a criação de leis, em 1850, como a Eusébio Queiroz, que manteve a figura do africano livre, de meia cara. Também citou outra lei, que foi preparando a sociedade para demonstrar que tipo de país teríamos, sobre terras devolutas do império e, das sesmarias, quando o Estado definia "o homem bom", para ganhar o acesso à terra. Também falou da posse mansa e pacífica, os chamados posseiros, na cultura de subsistência.
Ramatis pontuou que a partir da promulgação da lei só restou a possibilidade da compra, sendo que o posseiro não tinha dinheiro nenhum. E, a lei facilitou os sesmeiros. "O posseiro era pobre, branco, caboclo e negro alforriado. A partir daí o Estado mantem o processo que perdura até hoje. Esta lei de terra exclui o pobre", disse.
Outras leis que também contribuíram para esta exclusão, a exemplo da lei 2030, de 1871, do Ventre Livre, foi citada por Ramatis para mostrar que até os nove anos de idade a criança não seria entregue ao Estado, sendo que o fazendeiro podia explorar o seu trabalho até os 21 anos de idade. "Ou então seria mais uma criança criada nas fundações da vida, estilo Fundação Casa. A lei cometia mais uma perversidade, jogando-a na marginalidade", disse.
Ramatis comentou sobre a Lei Cotegipe, que libertava os escravos com mais de 60 anos, sendo que ele tinha uma vida útil de 20 anos. Assim, a lei foi uma maneira de livrar o dono, que já não possuía riqueza, levando o escravo a viver da mendicância. Disse que é comum falar que no Brasil o racismo se deu por comportamento e não por lei, o que contraria as pesquisas.
Também abordou a criação de leis sobre posturas municipais, no ano de 1888, que criavam dificuldades de promover atividades históricas do povo negro, que não podia mais criar animais, vender água e trabalhar em cocheiras, pois as leis na pratica proibiam o trabalho das pessoas negras.
Ramatis disse aos alunos do privilegio de hoje poder estudar, sendo que em 1854 era proibido os escravizados frequentar escolas. Foi proibido acesso à terra e ao estudo. Também citou o papel de cafeicultores, que criaram condições para a vinda de europeus ao Brasil. "Os ricos queriam embranquecer o pais. Passagem eram custeadas, incluindo estadias, viagem de trem para a região cafeeira e, recebiam bolsa família, 70 mil reais para adultos, 17 mil para adolescentes. Além da compra isentada da terra e pagamento de impostos", disse.
Queriam que imigrantes se transformassem no povo brasileiro, consideraram os indígenas e negros incapazes. Seus filhos puderam estudar, se acenderam socialmente, formando médicos e engenheiros, criando a classe média, de cidades como São Paulo.
"Não quero dizer que os imigrantes são os culpados e, sim foram os grandes proprietários. Eles foram utilizados e galgaram projeção social. Além de criar leis marginalizando o menor e o idoso, o Estado criou sistemas para beneficiar os imigrantes.
Ramatis disse que um dos aspectos mais terrível é que a história é contada de um olhar, sem observar que os grandes proprietários, que foram obrigados a mudar o modelo, tiveram a capacidade de roubar os negros. Se criou uma figura mítica, tirando o protagonismo do movimento negro.
Ramatis concluiu sua palestra elencando a figura de Zumbi dos Palmares, frente ao mito que se criou com o final da escravidão, na figura da princesa Izabel. E, exibiu imagens clássicas, comparando a revolução francesa com a princesa Izabel, seguida por fazendeiros e os negros como plateia, sendo que a pintura das artes plásticas cumpriu uma missão de santificação da princesa, num retrato da elite que quer ser protagonista da libertação e, por fim colocar a figura da princesa como redentora.
"A luta contra a escravidão foi uma conquisra da comunidade negra, sendo que a assinatura da lei Áurea se deu num momento que restavam cinco por cento de escravizados e, atendeu a pressão do império britânico em função do interesse do capitalismo. Quando acabou a escravidão, esta população negra foi impedida de trabalhar. Encontramos anúncios de jornais procurando ama de leite, que não fosse preta, carroceiro e chacareiro, de preferencia que não fossem negros", concluiu.
Na abertura dos debates, foram respondidos assuntos como a questão da violência policial, sistema de cotas para negros, tese do branqueamento pós revolução industrial e outras temáticas sobre o universo que compõe a exclusão do elemento negro na sociedade brasileira. Ramatis agradeceu a presença de todos e, reforçou a importância da juventude continuar lutando por uma sociedade mais justa.
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