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OBSERVATÓRIO - Manifesto de denúncia das chacinas na zona Norte de São Paulo - Abril/2014 - OBSERVATÓRIO DA JUVENTUDE

 


Abaixo o manifesto produzido coletivamente por diversas organizações atuantes na zona norte de São Paulo sobre as duas recentes chacinas de jovens que coincidem na forma de execução: grupo de jovens reunido atacado por atiradores.  



Estas, que denunciamos aqui, ocorreram nos dias 16 e 30 de abril de 2014, na Praça 7 Jovens e no Pq. Belém respectivamente (distância de 650m um local do outro), Distrito Brasilândia, zona norte de São Paulo. 



Fazemos o apelo para que outras entidades, assinem (no final da página) até o dia 12/05/14 e a partir de 13/05/14 divulguem o documento a seguir.

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Mais uma chacina de jovens! Até quando?



Quarta-feira, 16 de abril de 2014, quase duas horas da madrugada.

Praça Sete Jovens, Jardim Tereza - Jardim Eliza Maria, distrito da Brasilândia, zona norte de São Paulo. Diversas pessoas conversam no gramado e nos banquinhos próximos das árvores de pitanga, goiabeira, eucalipto e ficus que ficam no lado da Rua Pedro Pomar. Mais um dia de convivência na praça. De repente, segundo diversos relatos, dois homens encapuzados, chegam vindos da Rua Carlos Lamarca a pé e, na maior covardia, batem nos jovens e disparam contra eles:

POW! POW!     POW! POW! POW! POW! POW! POW! POW!    POW!    POW!  POW! POW!

Na varanda da casa em frente, uma jovem grita pelo terror que presencia e clama pela vida de seu irmão e dos jovens agredidos:

NÃO!     NÃO!        NÃO!

Os assassinos saem correndo diante da firmeza e coragem da moça, descendo a Rua Pedro Pomar em direção à Rua São Gonçalo do Abaeté.

+ 3 jovens foram assassinados covardemente:
Igor Caique Silva - 20/12/1996 -17 anos, 1 tiro nas costas,
Cleiton Martins de Oliveira - 19/04/1995 - 18 anos, 1 tiro na cabeça  
Marcos Vinicius de Oliveira - 09/09/1991 - 22 anos, 7 tiros
+ 2 jovens foram brutalmente agredidos:

Rodrigo de Souza, de 29 anos levou 2 tiros nas costas  
Eberton Silva de Castro que foi levado por seus familiares ao hospital, gravemente ferido por coronhadas, murros e pontapés na cabeça.

Outros jovens conseguem escapar e sobreviver. A unidade móvel do SAMU- Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - que fica na praça logo aparece e leva dois jovens que estavam feridos (Rodrigo e Cleiton, sendo que este não resistiu ao tiro na cabeça e faleceu no hospital). A ocorrência foi registrada no 72º distrito policial da Vila Penteado. Menos de uma hora depois destes crimes, numa agilidade que não é comum, policiais e a equipe do DHPP - Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa realizam “perícia” e levam os corpos e projéteis do local. Deixaram na praça duas blusas com sangue, umas folhas de alumínio, choros, indignação de amigos e familiares e um ar pesado cheio de questionamentos.

O “procedimento” policial e militar

Por que esta “perícia” foi feita logo após os assassinatos e ainda na escuridão da madrugada sendo que o “rabecão” do IML – Instituto Médico Legal - saiu antes das 4 horas da manhã da praça?

Por que na mesma manhã da quarta feira, 16 de abril de 2014, policiais militares dentro de viaturas, passaram pelo local dos crimes ameaçando os jovens, que lá estavam, dizendo “já morreram 3 esta madrugada, não fiquem por aí, que vai sobrar pra vocês também...”

Por que na quinta-feira, 17 de abril, jovens colocavam faixas de protesto na praça, e foram abordados por um policial civil com distintivo e armado, que exigiu identificações e telefones? Enquanto isso, um motociclista passou com seu capacete levantado e em tom de ameaça disse: “Olhaí, já ‘demos baixa’ em alguns não custa nada baixar outros”.

Por que este mesmo policial não tomou nenhuma providência e continuou sua “abordagem profissional” como se nada tivesse visto ou ouvido?

Que praça é esta?

A Praça Sete Jovens leva este nome em memória dos adolescentes que foram vítimas de uma chacina semelhante a que denunciamos. No dia 1º de fevereiro de 2007, no escadão da Rua Olga Benário, bem próximo da praça, no Jardim Tereza, acabou acontecendo uma grande tragédia, que ficou conhecida através da mídia como a “chacina dos 7 Jovens do Jardim Eliza Maria,  zona norte de São Paulo”.

Os jovens assassinados foram: Ewerton Damião Silva de Freitas, 18 anos; Rafael Jesus da Rocha, 20 anos; Douglas Ribeiro Francelino, 17 anos; Robson Oliveira Novais Cavalcante, 16 anos; os irmãos Francisco Itamar Lima da Silva, 17 anos e Antônio Elias Lima da Silva, 27 anos. Estes seis foram assassinados e um jovem ainda está vivo: Leandro Siqueira, o Mineirinho, com 19 anos na época.

Todos sem ficha criminal, apenas 7 jovens da periferia, que conversavam entre si no final da tarde quando, segundo relatos, quatro ocupantes encapuzados saíram de um Fiat Palio declarando-se policiais e mandaram que eles virassem de costas e dispararam muitos tiros com pistolas e revólveres. Apenas um sobreviveu. A promotoria da Justiça Militar apontou para o envolvimento de integrantes da Polícia Militar com chacinas na região em 2008, quando foi assassinado o Coronel da PM José Hermínio Rodrigues, na Avenida Eng. Caetano Álvares, zona norte de São Paulo, que investigava o envolvimento de seus subordinados em grupos de extermínio. Os policiais acusados da morte do Coronel foram absolvidos pela Justiça Militar em março de 2013. Outras chacinas foram esclarecidas tendo o envolvimento de PM’s que estão presos.

A Praça 7 jovens é utilizada por pessoas de todas as idades. Tem campo de futebol, quadra de basquete, pista de skate, palco aberto, dois espaços com brinquedos para crianças, a Escola Municipal Coronel José Hermínio Rodrigues, duas creches e uma unidade do SAMU.

A juventude se mobiliza e homenageia seus amigos e familiares

No domingo, 20 de abril de 2014, aproximadamente cem pessoas acenderam velas e vestiram camisetas com dizeres clamando por justiça e paz, num ato de luto pelos jovens assassinados, agredidos e a seus familiares durante o samba realizado mensalmente na praça, por jovens moradores do entorno. Apesar de chocante, o episódio não foi noticiado pelos grandes veículos de comunicação.

A atuação de alguns policiais no macabro episódio e depois dele, indica uma relação indevida e cúmplice com os assassinatos por parte de quem deveria defender as pessoas e a vida.

As perguntas que não querem calar

Quem são os criminosos?
Estão a mando de quem?
Por que policiais rondam a praça fazendo ameaças covardes e violentas?
  
Perguntas que não entraram na pauta da imprensa tradicional.
O silêncio e a omissão das autoridades são ensurdecedores e criminosos.
Perguntas insuportáveis de ficarem sem respostas mais uma vez.

Os assassinatos não param. A morte continua

Durante a escrita desta carta, na manhã de 1º de maio de 2014, ficamos sabendo que no dia anterior, às 22h30, na Rua Padre Manoel Honorato, no Parque Belém, a 650m da Praça Sete Jovens, dois homens descarregaram tiros de pistolas 9mm  e 380 em mais 5 jovens: 2 primos mortos de 17 anos Lucas Otavio da Silva Lima, vidraceiro e Matheus Jackson da Silva, pedreiro e 3 feridos: Bruno Erasmo Santos, 15 anos, estudante, Kelvin Robert Borges, 20 anos e Alan Custodio, 23 anos. Estes jovens estavam na calçada que eles, familiares, amigos e amigas conviviam em frente à casa de um deles. Suas vidas, de seus parentes e amigos acabam de sofrer uma agressão abominável.  Até quando?

Discursos para nos calar

Quando foram mortos os 7 jovens em 1º de abril de 2007, o que se ouvia era “que eram meninos envolvidos com o tráfico”. Eram apenas jovens que foram assassinados. Em 2008 policiais militares foram acusados de matarem o Coronel José Hermínio Rodrigues (absolvidos em 2013, o Ministério Público estadual afirma que recorrerá da decisão da Justiça Militar) e outros policiais militares foram condenados por envolvimento em diversas chacinas ocorridas na zona norte de São Paulo no mesmo período.

Dia 16 de abril de 2014, mais 5 jovens e outros que conseguiram se salvar, sofreram atentados criminosos. Diversas pessoas afirmaram “ah, estavam no lugar e hora fazendo coisa errada...”. Por que essa é a lógica cruel que é usada nas periferias para abafar crimes?

Na noite passada, 30 de abril, esta mesma violência se repetiu. Até quando? Até quando jovens, da periferia, continuarão sendo exterminados na cidade e no estado de São Paulo? O Estado se acovarda e se omite diante da violência assassina de grupos de extermínio e “justiceiros”.

Todos covardes e assassinos! NÃO VAMOS NOS CALAR!

"[...]
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
[...]"

Pela rigorosa apuração destes crimes!
Pelo fim da cultura da violência, do medo e da omissão!
Pelo fim do extermínio de jovens!

Continuaremos lutando pela vida para todos com dignidade e liberdade.

Vida Viva!

Viva a Vida!
 
 


 

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