OBSERVATÓRIO - Os últimos momentos do jornalismo de papel - Por Luís Nassif em 21/05/2013 na edição 747
Na sexta feira (17/5), a editoria “Poder”, do jornal Folha de S.Paulo, publicou seis matérias. A primeira, sobre a votação da Lei dos Portos, dividida em algumas sub-retrancas. A mais importante descrevia a votação e as reações suscitadas, com informações que já haviam sido abundantemente exploradas no dia anterior – inclusive pela Folha online.
No Estadão, reduziram-se cadernos, notícias e equipes.
Historicamente, o produto “notícia” sempre se baseou em poucas variedades de embalagens. Nos jornais mundiais de maior peso, formadores de opinião, buscava-se diferenciar do produto “entretenimento”. Para tanto, recorria-se a um estilo sóbrio, a um conteúdo analítico privilegiando o conceito de relevância.
Graças a isso, preservaram um público exigente, formador de opinião, que demanda do jornal o tratamento objetivo dos fatos e o exercício racional da análise – independentemente da linha política do jornal.
Leitores perdidos
No caso brasileiro, desde os anos 1990 os grandes jornais decidiram investir na notícia “entretenimento” e se valer dos recursos da dramaturgia como parte central da sua operação. Esse estilo consistia no seguinte:
>> Privilegiar sempre o fato próximo ao universo de informações do leitor comum. Por exemplo, se há uma reunião que define pontos importantes para o destino do país, privilegie a futrica, o detalhe pitoresco (bocejo de um dos presentes, ironia de outro etc.) em detrimento do assunto tratado.
>> No caso de grandes escândalos, tratar os personagens centrais com a caracterização dos roteiros de novelas, transformando-os em vilões completos ou em heróis imaculados.
>> Na hora da dramatização, não se prender aos fatos porque, em geral, são muito menos interessantes do que a fantasia. Com isso, aboliram-se os filtros mínimos de qualidade.
Durante algum tempo, funcionou, especialmente no período da redemocratização, no qual as fórmulas sensacionalistas, após anos de censura, eram novidade. De início, houve queda de qualidade e da credibilidade. Com a ampliação da Internet, esse modelo ruiu.
O jornalismo entretenimento consolidou-se na televisão – de programas mais toscos, policialescos, a programas mais elaborados, tipo Fantástico. A migração do leitor de entretenimento acelerou com a internet, oferecendo um prato para cada paladar. Para se destacar no caos da internet, os jornais teriam que investir no rigor e no discernimento. Mas radicalizaram no show.
Com isso, perderam os leitores de entretenimento e os leitores formadores de opinião. Ainda mantém o prestígio junto a setores mais refratários a mudanças – como os políticos e o poder judiciário. Mas é questão de tempo.
Anos de glória
Também os grandes jornais migrarão para a internet, terminando suas operações impressas. Mas lá serão apenas mais um agente de informação, com algum peso, mas sem poder mais ditar os rumos da opinião pública.
Cada dia em sua vida, nunca é mais, será sempre menos, deixando para trás seu grande momento de glória, os anos 1990, no qual toda a opinião pública era conduzida por um aparato extraordinariamente reduzido de publicações: Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo, Veja, devidamente repercutidos pelo Jornal Nacional.
Luis Nassif é jornalista
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