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OBSERVATÓRIO - Massacre do Carandiru é um dos motivos da criação de facção criminosa - 08/04/2013 - R7

Especialistas afirmam que criminosos de facção usaram tragédia para se legitimar e crescer


Faixa do PCC pendurada em unidade do Carandiru durante série de rebeliões em presídios de SP, em ação organizada pela facção criminosaMônica Zarattini/19.02.2001/Estadão
 
O massacre do Carandiru foi um dos motivos da criação de um dos mais complexos problemas de segurança pública do Estado de São Paulo: o PCC (Primeiro Comando da Capital). Em uma série de entrevistas feitas pelo R7, no ano passado, quando o massacre completou 20 anos, especialistas afirmaram que a facção usou a tragédia para se legitimar e crescer.
O episódio de 1992 foi o catalisador do processo de formação da facção criminosa, na análise da jornalista Fátima Souza, primeira repórter a noticiar a existência da organização. A denúncia foi feita em 1995 no Jornal da Band, da Rede Bandeirantes de Televisão.
— Os próprios integrantes que fundaram o PCC sempre falaram que o massacre na Casa de Detenção é parte da bandeira, mas não é a bandeira. O PCC foi fundado em setembro de 1993. Fazia quase um ano. O episódio, claro, foi lembrado. O massacre consta no "estatuto"da organização, mas não foi o que motivou a criação dela. Foi um dos motivos.
Autora do livro "PCC — A Facção" (Editora Record), Fátima diz que o Primeiro Comando da Capital nasceu como reação a uma política prisional marcada pelo encarceramento em massa e outros abusos.
— A facção, no começo, foi criada com uma ideia romântica de ser a voz dos detentos nas cadeias. O objetivo era ter um grupo unido, que pudesse lutar pelos direitos de quem está preso. Fizeram uma pauta do que não funcionava dentro das cadeias, incluindo o massacre. Segundo eles, a rebelião só eclodiu pelas péssimas condições no Carandiru.
A pesquisadora Alessandra Teixeira, do IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais) disse que foi o Estado quem forneceu as bases para o surgimento da facção.
— O massacre no Carandiru é, na verdade, o momento mais emblemático. A formação do PCC tem uma conexão, não só com o massacre, mas com toda essa política e, sobretudo, uma face da política que era executada no “Piranhão”, na Casa de Custódia de Taubaté, que é onde nasce a facção. O Estado fornece, de algum modo, os elementos para que uma massa prisional se articulasse ali dentro.
Já a antropóloga Karina Biondi, autora do livro “Junto e Misturado: uma etnografia do PCC” (Editora Terceiro Nome), destacou que as mortes dos 111 internos do Carandiru não estabeleceram uma relação de “causa e efeito”, mas ajudaram a reforçar o discurso da facção.
— O massacre no Carandiru marcou muito o universo carcerário e é constantemente lembrado como algo que se tem de evitar que volte a ocorrer. Nesse sentido, serve como um argumento fortíssimo para a proposta do PCC, de que os presos têm que se unir para lutar contra o que chamam de “opressão carcerária”.
"Acordo velado"

Para o jurista e professor Luiz Flávio Gomes, a queda dos índices de homicídios nas unidades prisionais de São Paulo foi possível devido a uma espécie de pacto velado entre o poder público e o PCC.

— Dentro dos presídios, o PCC passou a mandar. Quando eles vivem em tempos de paz, quando há um acordo de paz entre eles, ninguém morre nos presídios de São Paulo. E era uma rebelião atrás da outra. Mas acalmou tudo.

Alessandra faz leitura parecida. Para ela, a facção se tornou um “verdadeiro gestor prisional” no Estado.
— O PCC faz a gestão da prisão. De forma tácita. A prisão é hoje inteiramente gerida pelo PCC.

Gomes acrescenta que o suposto acordo, que funcionaria bem dentro dos presídios, nem sempre prevalece fora deles.

— A repressão é a única política que produziu um resultado até certo ponto, por causa do acordo. O PCC tem domínio fora dos presídios. Se ele diz para não matar, ninguém vai matar em determinada região. Porém, de vez em quando, esse acordo é perturbado, quebrado por uma das partes.
Expansão e consolidação

Alessandra pontua ainda que a facção só se consolidou graças à sua sustentação econômica.
— De algum modo, o PCC promoveu, num primeiro momento, aquilo que faltava, que o Estado deveria ter promovido, que era o mínimo de pacificação social dentro da prisão. Pacificação social, lógico, a partir de um código disciplinador, que não necessariamente é um código legal ou ético. A facção se favoreceu de um discurso que colou porque o sistema estava explodindo. Mas não podemos nos iludir. Ela (a facção) só se reproduz e se expande dentro do sistema porque havia uma questão econômica e há ainda, que é o tráfico de drogas dentro, num primeiro momento, e depois, fora.
Segundo a jornalista Fátima Souza, além das drogas, sequestros, armas e assaltos também dão sustentação à engrenagem financeira da organização criminosa. Ela diz que a facção ganhou braços em outros Estados quando o governo paulista decidiu, em 2002, espalhar os principais líderes do grupo criminoso pelo Brasil.
Outro lado
Em nota, a SSP (secretaria de Segurança Púbica) informou que as polícias de São Paulo não toleram desvios de conduta e, em todos os casos verificados nos últimos tempos, os policiais envolvidos foram presos e afastados. A secretaria afirmou ainda que, de 1999 a 2011, houve queda “de mais de 70% nos números de homicídios”. Já a PM disse, também por meio de nota, que "como o caso ainda está sendo apreciado e julgado pelo Poder Judiciário, bem como assistido pelo Ministério Público, compete à essas Instituições as manifestações oficiais sobre esse caso".

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